terça-feira, 15 de setembro de 2009

TEMPOS TRABALHOSOS
















Por Jorge Fernandes Isah

Na igreja, convivemos com os fariseus (leia aqui). Agora, veremos um outro grupo, daqueles que têm o nítido interesse em corromper a fé cristã, os apóstatas. Há muitos trechos na Escritura que os descrevem, mas, especialmente, analisaremos 2Tm 3.1-7.


Paulo inicia falando dos tempos trabalhosos que sobreviriam nos últimos dias (v.1). Essa é uma nítida evidência de que estamos diante de uma profecia. Muitos alegarão que ele está a predizer um futuro distante, o que é verdade. Mas, especificamente, ele escreveu a Timóteo, o seu “verdadeiro filho na fé” (1Tm 2), ou simplesmente “meu amado filho” (2Tm 1.2); com o objetivo de instruí-lo e exortá-lo a permanecer na “fé não fingida que em ti há” (2Tm 1.5). Portanto, Timóteo estava sendo alertado quanto aos filhos de satanás que se infiltrariam na Igreja a fim de perverter o Evangelho, causando estragos à fé. Como dupla profecia, ela serviu de alerta para Timóteo e os irmãos da Igreja Primitiva, quanto para todos os crentes em todos os tempos. Logo, é um aviso para nós também, o qual não pode ser negligenciado nem desprezado.


Os tempos difíceis referem-se não ao ataque externo, daqueles que odeiam a fé cristã, e estão dispostos a persegui-la, destruí-la se possível; mas ao ataque sutil, malévolo, engenhoso, daqueles que se dizem crentes, têm um comportamento parecido com o de um crente, muitos se comprometem com a Igreja, até mesmo professam algumas verdades, mas, em seu íntimo, têm a mesma aversão e ódio que os de fora, e o intuito é o de igualmente destruir a fé cristã.


São traidores, ardilosos; lançam discórdias, plantam dúvidas, suspeitam de quase tudo, espalham uma crença vacilante com o propósito de implantar na Igreja a perplexidade, a ambigüidade; fazer a fé cristã parecer menos a revelação divina e mais um amontoado de pontos indistintos; claramente dispostos a engendrar a confusão, o ceticismo, a rejeição à Palavra. Ao dar ouvidos a espíritos enganadores e a doutrina de demônios, têm a consciência cauterizada, e se entregam a proclamar a mentira (1Tm 4.1).


Eles trabalham como se fossem “missionários” satânicos, a espalhar o antievangelho, convocando nas fileiras de bancos das igrejas uma nova tropa de apóstatas que se unirão a eles e batalharão pela guerra perdida do seu general, contudo, sem deixar de fazer sérios e grandes estragos.


É interessante como esse processo se dá:


1- A pessoa ouve a mensagem do Evangelho.


2- Ela entende e compreende a mensagem. Do ponto de vista intelectual ela é capaz de estabelecer os vários pontos da doutrina cristã de forma correta.


3- Ela professa aceitá-la. Muitos dão testemunhos da sua fé, são batizados, participam da Ceia, e têm cargos de liderança na igreja. Ganham a confiança e o respeito quando, na verdade, são desrespeitosos e desconfiam de tudo e de todos.


4- Por fim, depois de algum tempo, rejeitam o Evangelho.


O estado final deles é o qual Pedro relatou em sua segunda epístola. Prometem liberdade quando são servos da corrupção. E após terem escapado da depravação do mundo, pelo conhecimento do Senhor Jesus, envolvem-se novamente nela, “e vencidos, tornou-se-lhes o último estado pior do que o primeiro. Porque melhor lhes fora não conhecerem o caminho da justiça, do que, conhecendo-o, desviarem-se do santo mandamento que lhes fora dado; deste modo sobreveio-lhes o que por um verdadeiro provérbio se diz: o cão voltou ao seu próprio vômito, e a porca lavada ao espojadouro de lama” (2Pe 2.20-22) [1].


Eles fingem-se cristãos para solapar o cristianismo; o que os torna ainda mais reprováveis, deploráveis, repugnantes, pois dizem amar o que odeiam, e estão dispostos a tudo para sabotar a verdade, subvertendo-a; utilizando-se da própria terminologia bíblica para adaptá-la à mentira, e assim, inventar outro evangelho, redefinindo as doutrinas cristãs segundo os seus padrões de malignidade, corroborado pelo silêncio tolerante da igreja em nome do falso amor.


No fundo, são o que Judas sintetizou: “Se introduziram alguns, que já antes estavam escritos para este mesmo juízo, homens ímpios, que convertem em dissolução a graça de Deus, e negam a Deus, único dominador e Senhor nosso, Jesus Cristo” (v. 4).


Mas, por que não são notados? E se são, por que a igreja permite-se ser envenenada?


1- Porque a maioria não conhece ou não se interessa em conhecer o Evangelho. Como antibereanos, deixam-se levar por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente” (Ef 4.14).

2- Porque a igreja amou mais dar satisfação ao mundo do que a Palavra e a si mesma. Amou mais as trevas do que a luz (Jo 3.19).

3- Porque a igreja não está disposta à autocorreção. Estão tão inchados em sua vaidade, ou são tão covardes em reconhecê-la, que não se dispõem a disciplina bíblica. Com isso os rebeldes estarão livres para lançar as sementes da dissolução, adubá-las, regá-las, e colher os frutos para satanás. Antes, já é tempo do julgamento começar pela casa de Deus (1Pe 4.17).

4- Porque a igreja desistiu de batalhar pela fé que uma vez dada aos santos (Jd 3); e decidiu não resistir mais, ao banquetear-se com o inimigo, recebendo o galardão da injustiça (2Pe 2.13), e apascentando-se a si mesma sem temor (Jd 12).

Dizem “paz, paz, quando não há paz” (Jr 8.11).


Desfraldamos a bandeira branca ao inimigo, convidamo-lo para celebrar o armistício; chegamos mesmo a deixar que governe a nossa casa; entregamos nossas armas; deixamos que desfrute dos nossos tesouros para, como bem-treinado terrorista e espião, atacar sutilmente e deteriorar a verdade, introduzindo fraudulentamente os desvios, os subornos que induzirão ao motim dentro da igreja.


“Tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela... que aprendem sempre, e nunca podem chegar ao conhecimento da verdade”(2Tm 3.5, 7).


Eles simulam piedade quando, na verdade, negam-na completamente na vida prática, pois não têm o menor desejo ou intenção de se afastarem dos seus pecados. Por mais que seja revelada a verdade, por mais que a vejam, ouçam, ela lhes será inexpugnável, seus ouvidos continuarão surdos, seus olhos cegos, suas mentes obliteradas, seus corações duros como pedras. “Como está escrito: Deus lhes deu espírito de profundo sono, olhos para não verem, e ouvidos para não ouvirem... a fim de que não vejam com os olhos, e compreendam no coração. E se convertam. E eu os cure” (Rm 11.8; Jo 12.40).


Hoje, para escândalo do Evangelho, muitos ditos “irmãos” sequer se preocupam em manter as aparências. Eles não agem sutilmente, nem dissimuladamente. São explícitos e diretos em sua pecaminosidade. Fazem questão de mostrá-la em alto e bom som para que todos vejam o quanto a sua alma é degradada; e batem no peito, garantindo que não mudarão, que terão de ser “engolidos” assim como são. Demonstram claramente a que vieram, e porque estão ali: a arrogância e o desprezo a Deus. São verdadeiros “caras-de-pau”, mas ao menos conhecemo-los o suficiente, pois não deixam nenhuma dúvida quanto aos seus caracteres ímpios. “Destes afastas-te” (2Tm 3.5). Mas, e quanto aos educados, tolerantes, encantadores, agradáveis, e revestidos de uma áurea inocente, com suas frases cheias de citações bíblicas, aparentando-se espirituais? Não são os mais difíceis de serem detectados? Aparentemente, sim. Contudo, Paulo os descreve precisamente: “estes resistem à verdade, sendo homens corruptos de entendimento e réprobos quanto à fé” (2Tm 3.8).


Quanto mais nos afastarmos da Bíblia, como a revelação divinamente inspirada de Deus; quanto mais nos envolvermos com os conceitos anticristãos; quanto mais dermos ouvidos às sandices do mundo, tendo a necessidade de nos justificar perante ele e de mantermos uma “aliança” perigosamente mortal; enquanto considerarmos que o homem do presente século é muito diferente do homem de dois mil anos atrás; enquanto nos enganarmos com as promessas de que os tempos são outros, e de que a verdade pode ser relativizada e contextualizada ao ponto de não se crer na infalível palavra de Deus; enquanto não resistirmos a todas as tendências imorais, antiéticas e voltadas unicamente para os deleites do homem, como o objetivo premente, à revelia dos princípios bíblicos; enquanto a fé for subjetiva em detrimento da objetividade do Evangelho; enquanto estivermos mais preocupados com as aparências do que com os fundamentos; enquanto estivermos adormecidos, e os agentes do mal labutando; enquanto... Seremos facilmente enganados até ao ponto em que não reconheceremos mais a verdade, e seduzidos pelo engano, teremos a mentira por fé.


Portanto, a Escritura, e somente ela, é a única capaz de revelar o inimigo, suas táticas, e a maneira segura de pô-lo em retirada.


Somente assim não seremos confundido, “porque tudo o que dantes foi escrito, para o nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação da Escrituras tenhamos esperança” (Rm 15.4).


Não se deve desprezar o inimigo, mas deve-se saber que, por Cristo, ele já foi e está vencido (Cl 2.15).


Os tempos são difíceis, porém, gloriosos.


Os tempos são trabalhosos, então, mãos-à-obra; porque "grande é, em verdade, a seara, mas os obreiros são poucos" (Lc 10.2).


Nota: [1] Sem entrar na questão da Perseverança dos Santos, Pedro não está dizendo que o crente, aquele que foi regenerado pelo Espírito Santo e salvo eternamente por Cristo, possa apostatar da fé. O texto analisa aqueles que ouviram a mensagem do Evangelho, professaram a fé cristã, mas, em algum momento, consideraram haver alguma injustiça no caminho da justiça e alguma mentira no caminho da verdade. Desta forma, estão a provocar Deus, e se voltam como cães adestrados pelo diabo a lamber o próprio vômito, ou seja, a volta à vida pecaminosa e da qual, por algum tempo, se afastaram. Assim, estarão aptos a receber o galardão da injustiça ao deleitarem-se em seus enganos.
Os eleitos, pelos quais Cristo morreu na cruz do Calvário, jamais apostatarão. Podem até envolverem-se em alguns erros doutrinários (erros periféricos, diria), mas a fé dada uma vez aos santos permanecerá firmada em seus corações como dádiva de Deus, e da qual nunca nos separará.

4 comentários:

Pr. Luiz Fernando disse...

Prezado irmão Jorge,
muito bem abordado o assunto. Paulo chega a dizer que tais pessoas aprendem e aprendem mas nunca chegam ao pleno conhecimento da verdade, pois, lhes falta o amor pela verdade. Estes não mais possuem ouvidos limpos para entender a verdade ou detectar a mentira, antes estão com comichões bloqueando a Palavra. A igreja, como congregação, erra pois está totalmente descuidada da Palavra, mas os atalaias estão calados ou tocam a trombeta errada não apontando para entrada do engano. Hoje em dia julgam que os gritos e berros são sinais da presença de Deus. A histeria grassa no meio do arraial do povo de Deus. Realmente são dias trabalhosos. Lembro-me de Spurgeon que no final do seu ministério enfrentou a heresia do modernismo bravamente e quase era a única voz na Inglaterra a clamar e dizer que uma onda de erro estava chegando até se desligar da comunhão batista inglesa. Mas creio que nesses tempos trabalhosos Deus tem seu remanescente fiel que apontará o caminho do arrependimento e da glória de Deus.
Para corroborar seu texto veja o vídeo clicando no link.
Um abraço.
Em Cristo

http://www.youtube.com/watch?v=hRu3enzYL_U

Jorge Fernandes Isah disse...

Pr. Luiz Fernando,
Boa lembrança sobre Spurgeon. Realmente ele foi alvo dos apóstatas que, preocupados com os modismos filosóficos da época (alta crítica, evolucionismo, liberalismo teológico, etc) obrigaram-no a sair da comunhão batista e isolar-se com o Tabernáculo Metropolitano.
Interessante que, após a sua morte, 5 anos depois, boa parte das doutrinas bíblicas por ele defendidas haviam sido substituídas por outras antibíblicas.
O ótimo livro do Iain Murray, "O Spurgeon Que Foi Esquecido", publicado pela Editora PES aborda a questão da controvérsia do Baixo Grau.

Quanto ao vídeo, em 5 minutos, não ouvi um versículo ou citação bíblica, na verdade, somente apelo sentimentalóide, palavras de ordem ao melhor estilo "panfletário", promessas descabidas, e práticas antibíblicas como tocar a arca. Se ela fosse a arca verdadeira, alguém ousaria tocá-la e ter o mesmo fim de Uzá?
O que vi é triste; e qualquer dia desses, alguém jogará milho no chão e pedirá aos espectadores para botarem ovos.

Mas como o irmão disse, Deus, assim como os 7.000 que não se curvaram a Baal, mantém o seu remanescente na terra.
Forte abraço.

Pr. Luiz Fernando disse...

Prezado irmão Jorge,
acredito que estamos promovendo a maior desevangelização do Brasil. Estamos jogando grande parcela da sociedade nos braços dos cultos orientais, pois, os evangélicos não possuem uma palavra que acalme a alma das pessoas, que aponte o caminho para Deus e muito menos respondam aos grandes questionamentos da vida. Nossa eclesiologia e consequentemente liturgia estão falidas. Muitos acham que ressuscitar o judaísmo, endemoninhar o homem e humanizar o diabo resolve o problema do homem. São dias realmente trabalhosos.
Um abraço

Jorge Fernandes Isah disse...

Pr. Luiz Fernando,

Suas palavras são a mais pura verdade, infelizmente.
A igreja deixou de ser sal e luz para ser mais um reduto das trevas na qual o mundo jaz.
Não há outra forma de influenciarmos e transformarmos o mundo a não ser pela pregação pura do Evangelho, e pelo viver uma vida cristã; ou seja, é necessário que a igreja entenda-se como Corpo e não cada um por si. Enquanto não se voltar aos primórdios do Cristianismo, quando cada irmão cuidava um do outro, não apenas no sustento material mas espiritual, auxiliando-o a permanecer no caminho, Cristo; enquanto as igrejas não se voltarem ao discipulado, à evangelização, a correr riscos por amor de Cristo; enquanto brincarmos de igreja domingueira onde vou prestar "um serviço" sem servir, apenas para afagar a minha alma e mantê-la apascentada por mim mesmo; estaremos distantes de cumprir o chamado que Deus tem para nós, o de sermos co-participantes na Sua obra.
O "eu" acaba por falar mais alto, nos entregamos a todo o tipo de diversão e distração humanas, enquanto o servir a Deus e ao próximo é um trabalho hercúleo, impossível.Então, acabamos por nos entregar à diversão, esperando que Deus levante alguém ou alguns para fazer a Sua obra. Mas ela é obrigação de todos os membros do Corpo, não somente de um.
Infelizmente se tem "pregado" a idéia de que a maioria pode ficar em casa diante da tv, bastando para isso contribuir financeiramente para a obra, que os agentes sustentados pelo dinheiro se encarregarão de realizá-la. Isso é a maior de todas as covardias e omissões: transferir aos outros a tarefa que nos cabe. A igreja tem de caminhar unida, e a obra é de todos.
Os dias são trabalhosos, há muito o que fazer, mas poucos os ceifeiros. Oremos para que Deus mude a mentalidade corrente, e levante não apenas um ou dois, mas avive poderosamente a Sua Igreja na terra.
Forte abraço; e obrigado por seus precisos e lúcidos comentários.