Por Jorge Fernandes Isah
INTRODUÇÃO
A imutabilidade divina quer dizer que Deus não muda. Mas ele não muda em quais aspectos?
A resposta é: em todos.
Deus é imutável em seu ser, em sua natureza, em seus atributos, de forma que ele sempre foi e sempre será o mesmo; não havendo possibilidade de variações em seu caráter ou em seus atos, nem o tornando melhor nem o piorando, visto ser Deus perfeito, infinitamente perfeito, e o perfeito não pode sofrer alterações. Se tal acontecesse a Deus, ele não seria perfeito, seria inconstante e sujeito as modificações, revelando-se dependente, subordinado a causações e motivações que alterariam o seu caráter, natureza e atitudes. E sabemos que as coisas finitas são em si mesmas limitadas e transitórias, passíveis de transformações ao longo do tempo, como as criaturas, por exemplo.
Certa vez, um filósofo, não sei se Heráclito ou Parmênides, disse: não se pode descer duas vezes no mesmo rio, porque novas águas sempre correm sobre você. Com isso, tem-se que a água, um elemento próprio em suas características, à medida em que corre no leito do rio vai-se alterando, perdendo e ganhando componentes que a modificam, impedindo-a de ser a mesma na nascente e continuar a mesma até chegar à foz. Vários fatores contribuirão para que a água não permaneça a mesma; águas de outros rios e da chuva, e com elas elementos provenientes de outros solos e da atmosfera, se incorporarão; dejetos químicos oriundos das indústrias e das residências se ligarão; enquanto o calor do sol evaporará alguns de seus componentes e, mesmo o homem, com suas técnicas de dragagem modificá-la-ão.
Mas sendo Deus absolutamente independente, eterno e infinito, tem-se que ele é também absolutamente imutável. E, assim, um atributo conduz a outros, os quais se relacionam entre si, conectando-se maravilhosamente, resultando no ser perfeito. Pois somente o ser perfeito, em sua natureza, impede e elimina toda alteração; porque as mudanças, invariavelmente, implicarão em imperfeição. É o que o salmista nos diz: “Mas tu, Senhor, permanecerás para sempre, a tua memória de geração em geração... Eles perecerão, mas tu permanecerás; todos eles se envelhecerão como um vestido; como roupa os mudarás, e ficarão mudados. Porém tu és o mesmo, e os teus anos nunca terão fim.” [Sl 102.12, 26-27]. No verso 11, lê-se: “Os meus dias são como a sombra que declina, e como a erva me vou secando”. O salmista se compara a uma sombra, e o que é uma sombra? É algo inconsistente, uma projeção, um espectro, efêmera, de pouca duração. Pode-se notar o quanto ela se faz diferente à medida em que se caminha, por exemplo. À medida que nos movemos, e o reflexo da luz altera-se quanto à posição do nosso corpo, a sombra se metamorfoseia, assumindo várias formas, ou desaparecendo. Ele também se compara a uma erva que se vai secando. Nasce vigorosa, cresce, e definha com o passar do tempo. Ao contrário dele, o Senhor é eterno; ano após ano, geração após geração, tudo muda, mas Deus é sempre o mesmo. Porque ele não está afeito ao tempo, nem sobre sua ação; e, como nós, não está preso a nenhuma contingência, incapaz de ser modificado através de quaisquer ações. Pelo contrário, é ele quem cria, muda e transforma tudo que existe. Assim, também, diz Tiago: “Toda a boa dádiva e todo o dom perfeito vem do alto, descendo do Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de variação” [Tg 1.17]. E novamente é-nos repetido quanto ao Senhor: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, e hoje, e eternamente” [Hb 13.8]. De maneira que até Balaão não teve como não proferir: “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?” [Nm 23.19]
Então, Deus diz de si: “Porque eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos” [Ml 3.6]. A afirmação é muito clara: Deus não muda; não há alteração no seu ser, na sua natureza, em seus atributos. Mas, também, em seus propósitos, decretos e promessas. Mesmo diante da miséria e pecaminosidade humana, Deus não se deixou influenciar pela condição decaída do homem, permanecendo o mesmo também em suas promessas, em seu plano eterno. Isso porque, entre outras coisas, o amor de Deus pelos eleitos também é imutável. É o que o apóstolo confirma: “Por isso, querendo Deus mostrar mais abundantemente a imutabilidade do seu conselho aos herdeiros da promessa, se interpôs com juramento; para que por duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a esperança proposta” [Hb 6.17-18]. Este trecho está diretamente relacionado com o Salmo 110.4, que diz: “Jurou o Senhor, e não se arrependerá”, declarando que Deus, não tendo por quem jurar, jurou por si mesmo, pois ele não falha no que diz, não desiste do que resolveu, nem muda o que estabeleceu. Ao contrário do homem, que é inconstante em suas promessas e juramentos, quebrando-os, como prova da infidelidade em seus propósitos, Deus declara que a sua vontade é única, imutável, irrevogável. Os seus planos, eternamente traçados, não se alteram, porque Deus é imutável. Ele é infinitamente poderoso tanto para elaborá-los como para executá-los, infalivelmente. Com isso, não se quer dizer que Deus seja fiel aos homens, ainda que isso possa, de alguma forma, ser estabelecido como verdade. Mas entendo que a fidelidade de Deus é primeiramente a si mesmo, e ao que decretou. Ele é autocoerente consigo mesmo, não desistindo nem revogando aquilo que prometeu, conservando-se fiel a si e às suas promessas. Logo, temos a certeza do cumprimento das suas promessas, porque Deus prometeu e as cumprirá. Pelo poder que tem de fazer todas as coisas, segundo o propósito imutável do seu ser.
Nota: Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico em 26.02.2012
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