Por Jorge Fernandes Isah
INTRODUÇÃO
Ouvimos falar de verdade constantemente, de que fulano falou a verdade, de que determinada frase é verdadeira, de aquela história é verdade, mas também da sua negação: de que isso é mentira, de que fulano é mentiroso, aquela história é falsa. Acontece que está em voga um conceito que se pressupõe verdadeiro quando afirma que não há verdade. A ironia é de que ele despreza e condenada qualquer conceito de verdade, a exceção é a própria afirmação, a sua base interna, de que não há verdade como verdade. Seria risível se não fosse trágico. Muitas pessoas declaram e repetem esse argumento como uma filosofia de vida, mas sua premissa é contraditória e falaciosa. Quando dizem não haver verdade alguma ou de que ela é algo completamente subjetivo, cabendo a cada um, segundo o seu bel-prazer, estabelecê-la e creditá-la, no sentido de que haverá apenas uma verdade pessoal e jamais universal ou objetiva, erram, contudo, ao validarem o seu próprio enunciado como verdadeiro, universal e objetivo. É o que se pode chamar de "samba-do-crioulo-doido", e um exclusivismo que são incapazes de reconhecer em "outras" verdades. Em linhas gerais, o que dizem é não haver verdade absoluta, quando querem que a sua afirmação seja, ela mesma e unicamente, uma verdade absoluta. Isso é o que se denominou chamar de pós-modernidade ou relativismo, onde as verdades podem ser adquiridas como frutas em feiras e descartadas do mesmo modo. Assim como um comprador gosta de maças vermelhas e grandes, outro comprador passará por elas sem qualquer desejo de comprá-las, preferindo frutas menos vistosas como a jaca, por exemplo. Ou seja, a verdade, assim como a fruta, se estabelecerá no indivíduo meramente pelo seu gosto ou predileção [como uma visão individual, onde só existe o "eu" presente], da mesma forma que poderá ser desprezada.
Do mesmo modo, afirmam não haver certo e errado, mas apenas uma verdade situacional, na qual determinado ato ou pensamento parecerá certo em dado momento e, por isso, será certo. O que buscam, ainda que inconscientemente é o caos social e moral, e muitos deles alcançam seus objetivos angariando a simpatia e concordância de outros, e, estilos de vida nitidamente destrutivos para a humanidade se estabelecem ou podem se estabelecer como verdadeiros simplesmente pela presunção ou estímulo de que sejam verdadeiros. O feminismo e o homossexualismo como fenômenos sociológicos, e o marxismo com político, se enquadram nesse sistema destrutivo de práticas anti-humanas [por humanidade, defino o homem como criado à imagem de Deus], onde as colunas-mestras são demolidas e em seu lugar colocadas varetas de mamonas incapazes de sustentar adequada e ordeiramente a sociedade. Não vou entrar na questão religiosa, como esse sistema sendo pecaminoso e a transgressão dos preceitos divinos. Basta verificar que a ausência de absolutos impossibilitaria a própria existência humana, e alegar a relatividade dos valores resulta apenas e simplesmente na baderna e caos, tanto moral como ético, levando a sociedade à destruição ou a sujeição ao totalitarismo.
Assistindo aos Três Patetas [The Three Stooges], em dado momento, Moe e Larry conversam à mesa:
Moe: Só imbecis têm certeza absoluta!
Larry, curioso: Tem certeza?
Moe respondeu, convicto: Claro!
Este trecho foi publicado na postagem "Mistério, Paradoxos e contradições aparentes - Parte 2", e recebi o seguinte comentário de um irmão, o Natan de Oliveira: "Até os Três Patetas sabem refutar o ceticismo...". Entendo que ele quis dizer "relativismo" ao invés de "ceticismo", mas o termo é também apropriado, já que a descrença na verdade absoluta é uma forma de ceticismo.
Mas o que vem a ser a verdade?
Segundo o Michaelis, é 1 Aquilo que é ou existe iniludivelmente. 2 Conformidade das coisas com o conceito que a mente forma delas. 3 Concepção clara de uma realidade. 4 Realidade, exatidão. 5 Sinceridade, boa-fé. 6 Princípio certo e verdadeiro; axioma. 7 Juízo ou proposição que não se pode negar racionalmente. 8 Conformidade do que se diz com o que se sente ou se pensa. 9 Máxima, sentença.
Para Platão, "Verdadeiro é o discurso que diz as coisas como são; falso é aquele que as diz como não são". Já Aristóteles dizia: "Negar aquilo que é e afirmar aquilo que não é, é falso, enquanto afirmar o que é e negar o que não é, é a verdade".
Temos aqui uma relação entre o pensamento, a linguagem e o objeto como concepção de verdade, de forma que o objeto ou o ser é a medida ou a validação do pensamento ou discurso. Por exemplo, determinado objeto não é branco porque se afirma que ele seja, mas afirma-se como verdade que ele é branco porque é. O cão, por exemplo, tem características diferentes das de um gato, e que o fazem cão e o gato, gato. Não seria a minha afirmação de que um gato é um cão que o tornaria em cão, o que seria falso. Porém, o fato de eu apontar um cão e afirmá-lo com tal é que faz o que digo ser verdade. Em relação aos objetos visíveis, perceptíveis e sentidos essas distinções são fáceis de se verificar. É impossível que o mar seja um rio e vice-versa. Que uma árvore seja uma rocha, e assim por diante. O fato de alguns seres como peixes, aves e repteis se camuflarem e aparentarem ser outra coisa, não os torna nelas. Eles permanecem sendo o que são, a despeito da ilusão visual que provocam. Mas nas questões metafísicas há uma dificuldade maior em se estabelecer o que seja verdade ou não. Não que elas sejam menos reais do que os objetos visíveis, mas é que, dado a nossa limitação, temporalidade e finitude, elas têm menos sentido ontológico para nós.
Quando os proponentes do pós-modernismo ou relativismo dizem que não há verdade objetiva, eles estão a dizer que o mundo e a realidade e, porque não, eles mesmos, não passam de um delírio ou ilusão. Mas acredito que se perguntados sobre a existência de si mesmos, não a negariam. Se o fizerem, o melhor é dar-lhes as costas e não perder tempo em demovê-los da sua loucura.
HÁ UMA VERDADE?
Sim. Não a minha verdade, pessoal e intransferível, ou as verdades de cada um de nós, se contrapondo umas às outras de forma que, no final, não haja verdade alguma mas um amontoado de opiniões, sentimentos e provocações, muitas delas sem qualquer controle ou cabimento. A Bíblia afirma que o homem, no Éden, decaiu, estando sob o efeito devastador do pecado, de forma que a sua natureza agirá motivada por ele. O pecado é o que conduz o homem a negar a Deus, seus preceitos ou Lei e palavra, resultando na negação da verdade. Ficando mais fácil, dessa forma, ele dar vazão à iniquidade, intentando sentir-se à margem da verdade. O que o levará a lutar obstinadamente pela sua demolição, a fim de erigir um altar à mentira, o engano, à imoralidade e corrupção. Destruindo-se a verdade, destrói-se a moral, e está-se mais próximo de si mesmo, do ser decaído, podendo-se negar vergonhosamente como imagem daquele que o formou e, então, negar o próprio Deus. É um esquema maligno e perverso em que o homem busca uma liberdade em si mesmo, a qual é impossível de se obter, visto estar ele preso em sua própria mentira, assim como um pássaro está livre em uma gaiola. De certa forma, há uma liberdade, mas não seria a liberdade absoluta que ele supõe ter, e que somente é possível em Deus.
Esse também é o motivo pelo qual se nega que a Bíblia seja a verdade. Negando a sua veracidade, nega-se o seu conteúdo, e a necessidade de aplicá-lo. Então, para eles, o pressuposto é de que não há o Deus bíblico, e, por conseguinte, não há a palavra infalível do Deus bíblico. Ao contrário, para nós, existe o pressuposto de que há apenas um Deus, o Deus bíblico, e de que sua palavra é a verdade. Mais do que nos ater ao conceito filosófico da verdade, resta-nos reconhecer pelo intelecto e pela fé que Deus é sempre verdadeiro e fiel. É o que Paulo diz: "Sempre seja Deus verdadeiro e todo o homem mentiroso" [Rm 3.4].
A VERACIDADE EM DEUS
Ora, se Deus é verdadeiro, há verdade em Deus, pois ele é toda a verdade, e a verdade somente pode proceder dele. Novamente o apóstolo diz que o homem é quem transforma a verdade de Deus em mentira, de tal forma que o seu coração possa estar cheio de imundície; não buscando o conhecimento de Deus, mas antes entregando-se a um sentimento perverso, para fazer coisas que não convém [Rm 1.25, 28]. No verso 29 em diante, ele descreve algumas dessas coisas, as quais ofendem a santidade divina e, por isso, quem as pratica está debaixo do seu juízo. Os homens conhecem o juízo divino, mas para manterem-se presos ao pecado, desejaram e optaram em negar a verdade, e, assim, negar o Deus vivo e verdadeiro; de forma que nem ele, nem o seu conhecimento, nem sua palavra sirvam de padrão máximo para o homem; e ele não repita o que está escrito: "Mas o Senhor Deus é a verdade; ele mesmo é o Deus vivo e o Rei eterno" [Jr 10.10]. Ora, ainda que o homem fale a verdade, e ele a falará, Deus é verdadeiro em seu ser, não havendo mentira nele. A verdade é essencial em Deus, de tal forma que se ele não fizer tudo conforme a verdade, nega-se a si mesmo, e não é Deus. Sem a verdade, Deus não seria Deus. E ele é Deus por ser a verdade.
Notas: 1-Aula realizada na E.B.D. do Tabernáculo Batista Bíblico em 13.05.2012;
2- Baixe o áudio desta aula em file.MP3
3- No áudio deste estudo, faço uma análise dos seguintes textos bíblicos, complementando este texto: Jo 14.6, Gn 3.1-6 e Rm 1.22-32
3- No áudio deste estudo, faço uma análise dos seguintes textos bíblicos, complementando este texto: Jo 14.6, Gn 3.1-6 e Rm 1.22-32