terça-feira, 17 de junho de 2008

RUTILAR













Por Jorge Fernandes

Por toda a Bíblia vemos a glória de Deus revelada em magnitude, autoridade, onipotência, santidade, perfeição, amor, misericórdia, graça, soberania... na criação do universo; do homem à Sua imagem e semelhança; na queda da humanidade; nas alianças com o Seu povo; na redenção definitiva pela morte sacrificial e substitutiva do Seu Filho Amado Jesus Cristo; nas promessas de vida eterna aos Seus escolhidos; na condenação igualmente eterna de Satanás e seus demônios, e de todos aqueles que rejeitaram a Palavra da Vida... em inúmeros outros aspectos, fatos, execuções e promessas é visível a glória de Deus, manifestada em tudo que existiu, subsiste e existirá.
Mas há duas passagens que nos mostram, de uma forma especial, o que nos espera na eternidade, quando estaremos diante de toda a majestade do nosso Deus. A primeira, encontra-se em Êxodo 33 e 34, quando é impossível não se emocionar com as narrativas escritas ali. Moíses, um dos grandes profetas de Deus, foi contemplado com o privilégio de falar com Ele. Durante a jornada de 40 anos até Canaã, ele presenciou todos os feitos realizados pelo Senhor em favor do Seu povo; mas, também, presenciou o quanto esse povo era rebelde, de dura cerviz para com Deus. Moíses viu a glória de Deus, e a hediondez dos seus semelhantes. Contudo, não é disso que quero falar...
Por quarenta dias, o profeta Moíses esteve em comunhão íntima com o Senhor. Pisou em terreno santo, e pôde vislumbrar a santidade Dele. Durante quarenta dias, ele esteve exposto à glória de Deus, de uma forma fantástica e única, a qual poucos homens tiveram entrada. Deus se revelou a Moíses como poucas vezes o fez: “E falava o Senhor a Moíses face a face, como qualquer fala com o seu amigo” (v.33.11). É claro que o profeta não ficava “cara a cara” com Deus, “frente a frente” com Ele. O próprio Senhor alertou-o: “Não poderás ver a minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face, e viverá”(v.33.20). A idéia a se passar é a de que havia uma comunhão íntima, um relacionamento pessoal entre o Senhor e Moíses; e de que esta era a vontade de Deus, de que o Seu povo compreendesse como era prazeroso e santo o relacionar-se com Ele. Através da submissão e obediência aos Seus mandamentos, o povo hebreu reverenciaria-O em adoração pura e santa. Nada parecido com a adoração pagã aos deuses mortos dos seus inimigos; “E habitarei no meio dos filhos de Israel, e lhes serei o seu Deus”(v.29.45).
A glória de Deus resplandecia no rosto do profeta, quando este desceu do monte Sinai, para levar as duas tábuas do testamento, a aliança de Deus com o povo de Israel: “Moíses não sabia que a pele do seu rosto resplandecia, depois que falara com ele”(v.34.29). O povo temeu chegar-se a Moíses; e ele era uma miniatura, quase um nada diante da santidade divina; e ainda assim, temeram, porque a iniquidade do povo estava manifestada frente ao testemunho do seu líder. Essa ínfima demonstração da glória de Deus, obrigou o profeta a pôr um veu sobre o rosto diante da congregação, até que entrasse para falar com Deus novamente (v.34.35).
Diante de um povo rebelde, inclinado ao mal, e sem arrepender-se (v.32.22; 33.3; 34.9), Deus em sua muita misericórdia não podia permanecer no meio dele, a fim de que a Sua glória não os consumisse, destruindo-os (v.33.5). E poderia fazê-lo, se não fosse a Sua graça, e a aliança que estabelecera com os patriarcas, “porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3.23) . Então, ordenou o Senhor a Moíses que erguesse uma tenda fora do arraial, e ali, “todo aquele que buscava o Senhor saía à tenda da congregação” (v.33.7).
Moíses exultou, proclamou o nome do Senhor, ao vê-lo descer numa nuvem e se pôr ali junto a ele, apressou-se, inclinou a cabeça à terra, e adorou-O (v.34.5;8).
A segunda passagem, encontra-se no cap. 9 de Lucas. Estando Jesus orando, “transfigurou-se a aparência do seu rosto, e a sua roupa ficou branca e mui resplandecente. E eis que estavam falando com ele dois homens, que eram Moisés e Elias, os quais apareceram com glória, e falavam da sua morte, a qual havia de cumprir-se em Jerusalém. E Pedro e os que estavam com ele... viram a sua glória e aqueles dois homens que estavam com ele” (v.29-32).
Vimos que Moíses teve o rosto, apenas o rosto, resplandecente. Ele fora como um espelho, um reflexo, a revelar minimamente a glória de Deus; uma glória que não era sua, que não podia gerar, mas que pela graça de Deus, unicamente pela Sua vontade soberana, passou a pertencer-lhe; e pertence a cada um de nós que fomos predestinados, chamados, justificados e glorificados em Cristo Jesus (Rm 8.30).
Então, agora parece que vemos uma repetição do que aconteceu com Moíses, quando da transfiguração do Senhor Jesus Cristo. Mas ao contrário do profeta que refletia a glória de Deus, Cristo é a própria glória de Deus. Vemos Jesus transfigurado, e a palavra transfigurar significa transformar, modificar a figura. Moíses apreendeu um fragmento do esplendor de Deus, e o seu rosto resplandecia, e o povo o temeu. Imagino o que seria de Moíses se não fosse a graça de Deus. Ele seria destruído. E o que seria de nós? As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim” (Lm 3.22).
Cristo é a própria glória de Deus, não um reflexo, um poder indireto, nem apenas um indicativo da fonte, aquele que aponta para Deus; mas o próprio Deus em unidade com o Pai e o Espírito Santo. A glória de Deus estava Nele, e era Ele (e está, e é Ele eternamente): “para que em tudo Deus seja glorificado por Jesus Cristo, a quem pertence a glória e poder para todo o sempre” (1Pe 4.11).
Pedro, extasiado com o que via, clamou ao Senhor para que se armassem três tendas, uma para Jesus, uma para Moíses, e outra para Elias (v.33). Mas a Bíblia afirma que ele não sabia o que dizia, mostrando a incapacidade de se compreender e absorver a vontade de Deus, quando o fazemos por nós mesmos, deliberados por nossa natureza corrompida.
“E, dizendo ele isto, veio uma nuvem que os cobriu com a sua sombra; e, entrando eles na nuvem, temeram”(v.34). Novamente, não resta ao homem mais nada diante da santidade e magnitude de Deus, do que o temor, em reverência e adoração.
“E saiu da nuvem uma voz que dizia: Este é o meu amado Filho; a ele ouvi”(v.35).
Moíses era o interprete de Deus junto ao povo de Israel. Ele transmitia-lhes tudo o que Deus lhe ordenou. Foi assim em relação aos mandamentos, à construção do tabernáculo, aos sacrifícios e cerimônias de consagração, às festas, ao sacerdócio dos levitas... aos trabalhos mínimos, como o cozer o pão sem fermento e a confecção de cortinas. Mas em tudo havia a vontade do Senhor para que assim fosse, e a tudo santificava; eram ordens a se cumprir, destinada ao Seu povo. Moíses, portanto, era o interlocutor da parte de Deus ao povo de Israel.
Cristo é o próprio Deus falando-nos. Sem a necessidade de um intermediário, por isso, o Pai exorta os discípulos a ouvi-lO. Não que Jesus seja uma voz solitária, individualista, não. Ele fala em conformidade com o Pai, porque tudo quanto o Pai faz, o Filho o faz igualmente (Jo 5.19): “Eu falo do que vi junto de meu Pai” (Jo 8.38), afirmou o Senhor; e exultamo-nos diante da harmonia eterna existente entre as pessoas da Trindade Santa.
Alguns estudiosos afirmam que Moíses viu a Jesus no monte Sinai, e que agora, diante dos discípulos, testemunhava a Sua divindade; o que João 5.46, parece confirmar: “Porque, se vós crêsseis em Moíses, creríeis em mim; porque de mim escreveu ele”. Por analogia, aceitamos que Moíses viu no monte Sinai a glória de Cristo, a qual Pedro, Tiago e João se deleitaram em contemplar (v.32).
Sem nos esquecer de que Moíses e Elias apareceram “com glória”, ao contrário de Jesus Cristo, pois Pedro e os demais ao despertarem, viram a “sua” glória. E regozijemo-nos; pois, na eternidade, receberemos a mesma glória que coube aos profetas, pela graça e para a glória de Deus.

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